A Via Crucis do Processo Terapêutico

Simbolicamente, a Via Crucis nada mais é o que um caminho de transformação interior, buscando compreensão, perdão e renovação. O terapeuta floral é aquele que nos conduz nesse percurso e lança mão dos florais para facilitar nossa jornada.

A via crucis no processo terapêutico

Quando me trouxeram esse tema “A Via Crucis do processo terapêutico” para um breve texto pensei em muitas coisas. “Será que o processo terapêutico é uma Via Crucis? Todos os processos? Será a Via Crucis que nos leva ao processo terapêutico? Ou seriam as duas coisas?”

Longe de ser uma intenção ter uma resposta concreta sobre isso, a ideia é refletirmos juntos, sem abordar religiões, conversando sobre o caráter metafórico, tentando traçar paralelos simbólicos sobre o tema e citando alguns florais que podem ter relação com esse pensamentos.

Uma jornada de sofrimento e renascimento

A Via Crucis foi um caminho de muitas etapas (estações) percorrido por Jesus Cristo para culminar, no entendimento de alguns, na sua crucificação. Foi um caminho cheio de dramas, dores, feridas e flagelos impingidos sobre Ele e realizados por outras pessoas durante o percurso dessa via, como se não bastasse já estar sentenciado e ainda levar o peso da sua própria cruz, até chegar ao que parecia ser o fim, a morte. Mas, o que nem todos lembram ou associam de imediato à Via Crucis, é que três dias após a crucificação veio a ressurreição e esta, a princípio, torna esse ciclo completo. E isso modifica muito o entendimento de todo o processo.

Assim, a Via Crucis abarca uma sentença, as dores, feridas e flagelos no caminho para a morte e a ressurreição. Traçando alguns paralelos simbólicos, quantas vezes ficamos impactados por uma vivência difícil e nos imputamos uma qualidade ou característica negativa? Podemos nos achar incapazes, culpados, fracassados, incompetentes e assim nos “sentenciamos” a condições de muito sofrimento, limites ou paralisações. Sim, muitas vezes somos nós mesmos os mais cruéis no autojulgamento, como se um juíz em nós decretasse a sentença.

E como chegamos a tal lugar?

Se atingimos essa situação tão difícil, provavelmente é porque não achamos recursos conscientes pra lidar melhor com a situação, e isso pode acontecer por várias razões. Podemos estar “presos” numa idealização de como deveríamos ser ou performar; fantasias que deveríamos ter uma atividade profissional específica, sucesso e posição social. Ou ainda resistência em entrar na vida adulta, amadurecer, envelhecer, relacionar, etc. Fora as violências, traumas, perdas e crises por eventos coletivos como a pandemia e eventos climáticos que por si só já são dramáticos, mas também podem tocar em questões individuais e coletivas ainda não trabalhadas.

A maioria de nós só começa um processo terapêutico, ou retorna a ele, quando chega em alguns destes limites de dores, doenças ou perdas de várias ordens. Iniciar um processo terapêutico não é garantia de melhora imediata e um dos sentidos do processo é fortalecer e flexibilizar a consciência para que ela lide com mais desenvoltura e adaptação às vivências.

Mas, por algum tempo, o processo pode não ser fácil e não deixa de ser um outro tipo de Via Crucis. Porém, quando estamos apoiados e seguros numa relação terapêutica temos menos resistências para encararmos as situações e podemos enxergar outras perspectivas internas e externas, colaborando com a integração e ressignificação do que nos aconteceu. E de fato como nos ensina Jung, importa mais como nos posicionamos diante dos acontecimentos e menos os acontecimentos em si.

A porta de saída

Se nos deixarmos fixar na ideia de que são os outros ou a vida e seus acontecimentos que nos fragilizam e tornam as nossas dores e dificuldades (cruzes) ainda mais pesadas e impossíveis de lidar, então estaremos nos deixando permanecer apenas na Via Crucis e não no autoconhecimento que permite a transformação (crucificação) acontecer e ressignificar (ressureição) daquilo que vivíamos como um sofrimento. As dores e conflitos abrem a oportunidade de crescimento e desenvolvimento para uma nova realidade. Nos responsabilizarmos por como vemos e lidamos com a vida e com as nossas características para deixarmos “morrer” algumas formas e renascermos em condições diferentes. Então os paralelos simbólicos são pra lá de úteis e interessantes.

O papel da terapia floral

Aproximando com a terapia floral, mais especificamente os florais de Bach, preciso ressaltar que os florais citados aqui são pensados de maneira muito generalista, pois estou relacionado florais a um processo simbólico dentro de um texto e não para uma pessoa com toda a sua natureza e personalidade. Sabemos muito bem que florais não são para condições ou doenças, e sim para como cada um vive essas condições. A subjetividade é que determina o floral e não o acontecimento.

Quando no inicio do texto me referi a acontecimentos que nos impactam e nos desestabilizam, penso imediatamente em Five Flower Remedy, pela indeterminação de qual núcleo ou característica o impacto tocou em nós e o quanto esta essência pode nos ajudar a ficarmos calmos, presentes e conscientes do que e como estamos vivenciando o acontecimento.

Nas quatro fases consideradas aqui para a Via Crucis, associo muito Pine ao momento da sentença, seja pelo julgamento do outro sobre nós ou do próprio “juíz interno”, seja pelo núcleo de dor ou de fragilidade que foi tocado quando não respondemos ao acontecido como gostaríamos. Quando aceitamos a sentença negativa é muito comum a sensação de culpa, inadequação, remorso, menos valia e não merecimento. Dessa forma, Pine trabalha pela via positiva da autoaceitação e do perdão, estimulando o indivíduo a seguir na evolução dos acontecimentos ao invés de paralisar nas emoções negativas, trazendo consciência e responsabilidade para uma melhor resposta.

Quando outras emoções entram em cena

Além da culpa, outras emoções podem

  • Para os sofrimentos, dores e sensações de limites emocionais podemos pensar em muitos como Gentian, que trabalha a persistência apesar das frustrações e o acreditar no bom desfecho e Gorse, que trabalha a não desistência apesar do momento de grande escuridão, trazendo uma profunda esperança e fé através de insights luminosos de mudança, podendo promover um amplo reajustamento na psique, o que alguns chamam de “cura”.
  • Mimulus que encoraja e traz força moral para continuar o processo.
  • Larch para quando as dores são tão grandes que achamos que não temos capacidade para lidar com elas e também Chestnut Bud, para que os aprendizados sejam absorvidos e não precisemos repetir situações que continuem a nos machucar, as vezes reforçando num círculo vicioso.
  • Por fim, relaciono mais duas essências: Star of Bethlehem para quando o processo de transformação é muito profundo e doloroso, trazendo calma e nos tranquilizando diante de situações traumáticas e talvez a essência mais importante para todo processo de grandes transformações, o Sweet Chestnut, que nos conforta diante do desespero e profunda angústia.

Como dizem Richard Katz e Patrícia Kaminski no seu livro de Repertório das essências florais:

É exatamente dessa forma que a cura transformacional se torna possível, pois quando a alma é estendida até seus limites ela também se torna transcendente. Ela ajuda a alma a se entregar e a abrir-se a uma nova identidade espiritual. (KAMINSKI, KATZ, 1997, p. 353)

Concluindo…

Assim, dentro desta visão simbólica, o processo terapêutico – a Via Crucis, nos convida ao autoconhecimento através das transformações e ressignificações e a nos tornarmos mais a nós mesmos num percurso com mais significado. A própria Via Sacra, o caminho do sagrado.

Referências:

KAMINSKI, Patrícia; KATZ, Richard. Repertório das Essências Florais. Um Guia Abrangente das Essências Florais Norte Americanas e Inglesas, para o Bem-estar Emocional e Espiritual. São Paulo: Triom,1997.

Ana Roxo

Ana Roxo

Filósofa pela Universidade Metodista. Especialista em Psicologia Junguiana pelo IJEP – Instituto Junguiano de Ensino e Pesquisa. Pós-graduanda em Psicossomática com abordagem Junguiana pelo IJEP – Instituto Junguiano de Ensino e Pesquisa. Terapeuta Floral pela Abreflor – Assoc. Bras. Terapeutas Florais. Facilitadora da Healingherbs Bach Flower Remedies – Inglaterra, Instrutora Credenciada pelos Florais de Minas. Atuação clínica em São Paulo, Sorocaba e Online. Ministra cursos de formação em Terapia Floral.

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