Por uma vida autêntica

A alma, o mais profundo em nós, anseia por contagiar nossas escolhas e fazeres. Nesta inspiradora conversa com a arteterapeuta Patrícia Pinna Bernardo, você vai saber como dar vazão a esse jeito só nosso de viver.

Patrícia Pinna Bernardo gosta de cor. Seu espaço terapêutico, como também suas vestimentas e adornos, tingem os olhos com pinceladas alegres, em tom de brincadeira. É que, para esta psicóloga junguiana e arteterapeuta, a alma é soberana na vida. E, como tal, merece se expressar à vontade em nosso cotidiano, do jeito mais verdadeiro possível. Se nutrirmos nosso interior com alimento de qualidade, ela ensina, faremos contato com essa mestra e guia, a nos conduzir pelas trilhas da autorrealização.

Como é libertador transbordar nossa autenticidade, o que somos lá dentro, na essência, não é mesmo? Descubra, a seguir, como trazer para o mundo o que você carrega de mais genuíno. E prepare-se para inspirar as pessoas ao redor.

O que a gente precisa fazer para escutar a voz interior que nos mostra o caminho de uma vida mais autêntica?

Ter uma prática diária de escuta interior e centramento, como meditação, manter um caderno de sonhos, praticar Yoga, por exemplo, além de se dedicar ao autoconhecimento e/ou atividades criativas, como psicoterapia ou arteterapia. Segundo o mitólogo Viktor Salis, a prática do ócio criador, para os gregos antigos, era fundamental para uma vida saudável e com significado: ao silenciar o burburinho mental podemos ouvir a nossa musa, que nos inspira e nos direciona ao alinhamento com a nossa essência, nos colocando na rota de uma vida criativa, em que acessamos e compartilhamos com o mundo os nossos dons e talentos. Eles visavam com isso que o interior fosse igual ao exterior. Jung chamou esse processo de caminho de individuação.

De onde vem a coragem para nos lançarmos no mundo por meio de escolhas que expressam nosso verdadeiro ser?

Do coração, como a própria etimologia da palavra coragem expressa: ela vem do latim coraticum, derivado de cor, “coração”. Como disse Carlos Castãneda: “Esse caminho tem um coração? Se tiver, o caminho é bom; se não tiver, não presta”. Quando somos fiéis à nossa verdade, agindo com o coração, a sensação é de satisfação por estarmos no lugar certo, com as pessoas certas, fazendo a coisa certa.

Como as pessoas podem aproveitar esse momento de crise planetária para viverem da forma mais honesta e autêntica possível, conectadas com aquilo que realmente lhes faz bem?

Nunca foi tão urgente cultivar a vida interior, embora a qualquer tempo isso seja necessário. Esse olhar para dentro corresponde a se olhar no espelho da alma, e daí ter a noção do quanto a vida que se está ou estava levando reflete os nossos anseios mais profundos, podendo avaliar se nos traz o sentimento de autorrealização. A partir desse distanciamento da rotina que nos era habitual podemos ter uma visão crítica da nossa realidade, e realinhar interior e exterior.

Isso tem a ver com buscarmos o nosso propósito?

Uma vida com propósito é o caminho para nos mantermos saudáveis em todos os níveis, pois a nossa verdade é também o nosso remédio original. A homeopatia se baseia nisso: o nosso remédio de fundo é feito da erva que mais se assemelha ao nosso estilo de ser. Há maneiras lúdicas de se chegar a essa compreensão também, através de jogos de autoconhecimento, como um jogo arteterapêutico que eu criei para trabalhar essas questões, que eu nomeei: “Semente de que eu sou? O jogo dos dons e talentos”.

Existe um caminho de vida autêntica que não passe por crises ou rupturas dolorosas?

As crises são inerentes ao nosso desenvolvimento, não há como escapar delas, que marcam sempre mudanças importantes na nossa vida. No entanto, os povos ancestrais dispunham de rituais de iniciação e passagem que assessoravam a pessoa nesse processo, ajudando-a a canalizar a sua energia para o enfrentamento dessas mudanças necessárias, encontrando um sentido para elas.

Então, a dor é inevitável?

A abertura ao novo sempre envolve um corte com o velho modo de vida, e todo corte dói e sangra, sem dúvida, mas o importante é transcender a dor, pois ela também é dor de parto, em que o prazer da inauguração de um novo momento existencial faz tudo valer a pena. Laura Villares, psicóloga junguiana, em sua dissertação de mestrado, coloca que a psicoterapia é uma das formas de auxiliar a pessoa nessas mudanças, sendo a psicoterapia como um rito atual de iniciação, já que a pessoa a procura em situações de crise, e não dispomos mais desses rituais em nossa cultura. E toda crise vem de um chamado da alma, nos convocando a alinhar mundo interno e externo.

Fico pensando quão livres e autênticos podemos ser num mundo domesticado. Para que essa liberdade seja vivida de fato, nós precisamos nos despojar de quê?

Nós precisamos nos despojar do desejo de hegemonia do ego, de “agradar” aos outros o tempo todo, para podermos viver a nossa vida de forma autêntica, nos colocando a serviço do Todo, colocando o ego a serviço do Self, como nos ensinou C. G. Jung. Nessa perspectiva, o que é bom para nós só é bom se também o for para todos os envolvidos. Liberdade pressupõe limites, e saber colocar e respeitar limites saudáveis é fundamental para o exercício da nossa liberdade. Como Nietzsche escreveu, as parcas, que são as tecelãs do destino, “guiam aqueles que querem, os que não querem elas arrastam”.

Você consegue sintetizar em uma única palavra ou frase o que importa de verdade na jornada humana?

Vou citar Jung: “Numa análise final, só valemos alguma coisa por causa do essencial que personificamos, e se não personificarmos isso, a vida será desperdiçada”.

Gostou desse bate-papo? Então, vasculhe um pouco mais e saiba como ir ao encontro de si mesmo, da sua própria essência.

Patrícia Pinna Bernardo

Psicóloga junguiana, arteterapeuta, pós-dra em Mitologia Criativa e Arteterapia (USP). Coordenadora de cursos livres (pelo Zoom) e de Pós-graduações sobre Arteterapia, Mitologia Criativa, Mitodrama e Teatro Arquetípico. 

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Youtube: https://www.youtube.com/user/arterapinna 

Blog: patriciapinna.blogspot.com

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